domingo, 8 de novembro de 2009


500 anos depois, livro pode mudar

São Paulo (AE) - Enfim, o Kindle chegou ao Brasil. E como seu nome parece insinua (algo como "por fogo", em inglês), ele de fato acendeu as discussões em torno do futuro dos livros na era digital por aqui – e, a bem da verdade, em todo o mundo. Ninguém discute que o e-book veio para ficar, no entanto, essa é uma frágil certeza cercada por um mar de dúvidas.
A primeira não é nem de longe a mais importante: quando a versão eletrônica vai suplantar o bom e velho livro de papel? Uma pesquisa realizada pela organização da 61ª Feira do Livro de Frankfurt, a maior e mais importante do setor no mundo, entre jornalistas, escritores, editores e livreiros, revelou que 50% deles acredita que será em 2018. Não é de se surpreender essa divisão.
O que se avizinha é a maior mudança pela qual o mercado editorial – afinal, leitores de livro eletrônico, como o Kindle, servem para ler jornais e revistas também – jamais enfrentou. Nos cerca de 100 anos da música como produto, a partir da invenção do fonógrafo, ela evoluiu e se espalhou por diversos formatos (cilindros de cera, discos de goma-laca, de vinil, fita cassete, CD e finalmente MP3) e mídias (rádio, walkman, internet, iPod). O livro, por sua vez, em mais de 500 anos de história quase não mudou. A mais relevante dessas sutis mudanças foi o surgimento do livro de bolso no início do século passado. Quer dizer, mudou, mas continuou igual.
A história do livro sempre esteve ligada ao seu suporte – uma tecnologia difícil de ser superada. É relativamente barato, pode ser levado a qualquer lugar, não usa bateria e seu uso é extremamente simples, não requer prática, tampouco habilidade.
Já houve leitores de livros eletrônicos antes do Kindle, mas foi apenas com ele (e alguns outros bons modelos que surgiram nos últimos anos, ainda inéditos por aqui) que começou a fazer algum sentido pensar que, um dia, o livro de papel não será o principal suporte para a literatura. "Esse é um processo sem volta", afirma Sérgio Machado, presidente da editora Record.
Entre as editoras ouvidas pelo Link é unânime a opinião de que o e-book veio para ficar. A forma e a velocidade como cada uma delas pretendem se adaptar, no entanto, é bem diferente. A Ediouro planeja, já para as próximas semanas, o lançamento do aguardado novo livro de Rubem Fonseca, pelo selo Agir, para Kindle e iPhone. Já a Companhia das Letras, Cosac Naify, Planeta e a própria Record, confirmam as negociações com a Amazon, dona do Kindle, mas nenhum lançamento no formato, pelo menos por enquanto.
Em uníssono, por sua vez, elas afirmam que sua função independe do suporte. "Somos editores de conteúdo", costumam repetir, além de concordar com o fato de que os livros técnicos e de referência devem ser os primeiros a migrar para o suporte eletrônico.
Apesar de todo o burburinho em torno do assunto, essa transição está dando apenas os seus primeiros passos. Mesmo nos Estados Unidos, o processo de massificação dos leitores eletrônicos parece distante. Suas vendas, no entanto, crescem: 3 milhões de aparelhos devem ser comercializados, neste ano, apenas nos EUA. E as previsões para os próximos anos são extremamente favoráveis também.
Paralelamente, tem se observado nos últimos anos algumas experiências que buscam oferecer, algo além do livro de papel (envolvendo a internet e vídeos, por exemplo) para contar uma história. O curioso é que o Kindle, apesar de todo o verniz tecnológico que o cerca, busca ser o mais fiel possível ao bom e velho livro de papel. Quer dizer, ainda que o suporte seja trocado, no fundo, os livros continuam exatamente os mesmos. Afinal, por enquanto, um bom livro ainda é aquele em que a história se completa na sua cabeça.

‘Ele é bom para livros que não quero ter’São Paulo (AE) - O escritor Rodrigo Lacerda, autor de O Fazedor de Velhos, está contente com o Kindle que ganhou há dois meses. Depois de registrado nos EUA, ele conseguiu usar normalmente o aparelho - do mesmo modelo que é vendido para o Brasil. A única diferença é que ele não pode comprar e baixar os livros digitais diretamente pelo Kindle porque a conexão sem fio, pela rede de celular, não é compatível.
Por enquanto, ele comprou apenas um livro digital pelo site da Amazon e transferiu-o para o eletrônico. "Achei ótimo para ler. Ele é bem fino e leve, e a leitura é bem confortável, não cansa. Mas acho que ele é bom mesmo para comprar e ler os livros que não faço questão de ter fisicamente. Eles não ocupam espaço, são bons para levar em viagens e a versão digital poupa o tempo de entrega. Livros de literatura, de autores que gosto, prefiro ter em papel", diz o escritor.
"A tendência é que haja uma convivência. Não tenho medo de que o livro vai acabar. Mas é cedo para saber o impacto do Kindle, sobretudo no Brasil. Ele é muito caro. Vai demorar para se popularizar."

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